Um final de semana não pode ser suficiente para tirar da pauta a violência que invadiu a escola pública de Suzano. Quem de nós, ao deixar o filho na porta da escola hoje, no momento em que sempre desejamos boa aula, também não sentiu um aperto maior no coração?
Além da comoção nacional e internacional, a repercussão ao ataque à Escola Raul Brasil foi marcada por discursos de teor ideológico, tanto dos que são contra a facilitação do uso de armas quanto dos que são a favor. Chegamos até a ouvir neste plenário a defesa, ao meu ver, inconcebível, de mais armas e menos livros aos nossos estudantes!
Ficamos chocados com o caso de Suzano, mas lembro aqui que os ataques em escolas no Brasil acontecem desde 2002. Nos últimos 17 anos, VINTE E CINCO pessoas, entre alunos e professores, foram mortos dentro do ambiente escolar. Não podemos mais ter memória curta. A sociedade espera de nós mais do que intervenções imediatistas.
Escola não é lugar de arma. Escola é lugar de criança. E criança e arma, definitivamente, não combinam. O combate às violências, NA escola, DA escola e À escola não se resolve com o armamento. Em vez da implantação de novas medidas de segurança armada, essa urgente tarefa requer o nosso trabalho de fiscalização, para que medidas já existentes sejam cumpridas nas escolas públicas de Santa Catarina.
Desde 2012, sob o comando da nossa presidenta Dilma Rousseff, nossas escolas públicas têm uma Política de Educação, Prevenção, Atenção e Atendimento às Violências nas Escolas. Aqui em Santa Catarina, essa política foi reeditada no ano passado, em um volume de 42 páginas. Quantos conhecem o teor desse documento?
Uma das principais diretrizes prevê que toda unidade escolar tenha o seu NEPRE, o Núcleo reunindo todos os agentes, desde professores até as famílias dos estudantes, para garantir a efetivação dessa política protetora. Agora eu pergunto: quantas escolas catarinenses têm hoje o seu NEPRE em pleno funcionamento?
A Secretaria de Estado da Educação, até agora, não demonstrou ter entre as suas prioridades para 2019 a garantia de segurança aos nossos estudantes. Reportagem deste final de semana, no jornal Diário Catarinense, revelou que a maioria das escolas possui apenas câmeras de monitoramento com foco na vigilância patrimonial. Ou seja, o patrimônio físico recebe maior atenção do que nosso maior bem: as vidas das nossas crianças e adolescentes. Na reportagem, diretores de escolas de Joinville e Blumenau demonstraram a preocupação com esse olhar em depoimentos que certamente chegam também aos ouvidos da Comissão de Educação desta Casa.
Aproveito para lembrar que promover medidas de conscientização, prevenção e combate a todos os tipos de violência, assim como promover a cultura de paz, passaram a ser obrigações por lei em todas as unidades de ensino do País desde maio do ano passado. (Lei nº 13.663, de 14 de maio de 2018)
Agora, vejam o tamanho da contradição: como se pode pleitear a propagação de armas no ambiente escolar se uma Lei Federal determina que as escolas têm a obrigação de promover a cultura da paz? Quem acredita, falsamente, que a segurança armada é a solução, está, ao mesmo tempo, defendendo que daqui a pouco nossos filhos tenham de estar expostos a armas em todos os espaços de convívio e lazer, como consultórios médicos e parques públicos!
Dentre os ataques registrados no Brasil nos últimos anos, não podemos esquecer que os tiros disparados por um estudante dentro de um colégio particular de Goiânia, em 2017, que mataram 2 estudantes e feriram outros 4, saíram da arma de um policial militar, pai do garoto. Igualmente em 2011, quando um menino de apenas 10 anos de idade atirou contra a professora e em seguida tirou a própria vida, usando a arma do pai, um guarda-civil municipal, no interior de São Paulo.
Esses dois exemplos nos alertam para a realidade: não se pode garantir que nossas crianças e nossos adolescentes estarão protegidos em um ambiente armado. Conviver com armas é respirar a atmosfera do medo. Imaginemos os nossos filhos, brincando no pátio de pega-pega na hora do recreio, podendo esbarrar na arma de um agente de segurança? Quem de nós quer seu filho exposto ao risco iminente de uma bala perdida?
Esclareço que, ao contrário da ideia propagada, inclusive neste parlamento na semana passada, os ataques em escolas nos Estados Unidos são um fenômeno crescente, que não conseguiu ser freado pela atuação armada dentro dos colégios. Tanto é que a sociedade americana neste momento está empenhada em rediscutir a política do uso de armas, justamente para combater o avanço da violência para dentro dos muros onde nossos filhos deveriam ter a liberdade de dedicarem-se exclusivamente a fundamental tarefa de aprender.
Uma reportagem do Fantástico, no último domingo, mostrou estudantes americanos, muitos com a mesma idade das vítimas que perdemos em Suzano, indo às ruas para dizer que, no que depender deles, não serão os próximos.
(Sugestão: posso editar o vídeo para 2:30’’)
Antes de encerrar minha fala, mostro um dado que acredito ser desconhecido inclusive pelos colegas deste parlamento que defendem o modelo americano de uso de armas como o melhor para a sociedade:TODOS OS ANOS, 2.751 CRIANÇAS MORREM NOS ESTADOS UNIDOS EM DECORRÊNCIA DE ARMAS DE FOGO. É A SEGUNDA MAIOR CAUSA DE MORTE NA FAIXA ETÁRIA DOS EUA.
E o pior: pesquisas científicas, como a feita pela Escola de Medicina de Stanford, concluíram que Estados com legislação mais flexível ao uso de armas fazem mais vítimas entre as crianças.
Armas matam. Logo, concluo com uma pergunta:
Como os legisladores que pregam o resgate e o fortalecimento dos valores cristãos nas nossas escolas e nas nossas famílias podem defender as armas de fogo, se o quinto dos dez mandamentos que servem de base para a doutrina cristã, prega, de forma clara e objetiva, a ordem para não matar?
Confesso que ainda não consegui conceber uma resposta coerente.