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Entrevista: NSC publica como Luciane Carminatti enfrentou o câncer que mais afeta as mulheres brasileiras

Entrevista assinada pela jornalista Dagmara Spautz, e originalmente publicada na edição impressa da Revista NSC, de 19 a 25 de março de 2022

Habituada aos embates que são parte do dia a dia na política, a deputada estadual Luciane Carminatti (PT) soube, aos 51 anos, que enfrentaria a maior batalha. E seria pela vida. A líder da bancada feminina da Assembleia Legislativa descobriu no ano passado um câncer de mama. A doença, que a afastou temporariamente das atividades legislativas no segundo semestre de 2021, foi tratada com discrição pela parlamentar.
Ela recebeu a reportagem no gabinete dela na Alesc em um dia simbólico: 8 de
Março, Dia Internacional da Mulher. Em cerca de meia hora de entrevista, a deputada revisitou os momentos mais difíceis da jornada contra o câncer.


Mais de uma vez, os olhos se encheram de lágrimas – mas a voz não falhou em nenhum momento. A única pausa ocorreu quando perguntei se a experiência havia feito da deputada uma nova mulher. Ela pensou durante alguns segundos antes de
responder que passou a enxergar o feminino por trás de cada sofrimento.
Nesta entrevista, Carminatti relata como a convivência com outras mulheres, sem condições financeiras de complementar o tratamento, fez despontarem novas frentes de luta na bancada feminina da Alesc. O câncer enfrentado pela deputada é o de maior prevalência entre as mulheres brasileiras, quase um terço do total.


São 60 mil novos casos ao ano, segundo dados do Instituto Nacional do Câncer
(Inca). Luciane Carminatti passou por cirurgia para retirada do tumor, radioterapia, e
agora segue em tratamento complementar preventivo. Confira detalhes na entrevista a seguir:

A senhora demorou um período para falar abertamente sobre o que aconteceu, por quê?

Sempre me cuidei, fiz os exames todo ano. Você leva um choque, porque pensa “Não pode ser comigo isso, faço mamografia todo ano. Como é que agora descubro que tenho dois nódulos na mama esquerda?”. Tem uma coisa que fui descobrindo,
e que as mulheres passam. Primeiro, é a negação da doença. Você não quer falar disso. Não me sentia inteira para dar conta do que as pessoas esperavam que eu falasse sobre isso naquele momento. É uma fase.

Fui lendo mais, ouvindo mais profissionais, e o meu médico foi muito hábil nisso, me mostrou que tem cura, tem tratamento. Quando fui sentindo o chão, fui começando a poder falar. E tinha ainda uma coisa, eu estava no meio de um debate na Assembleia, de um fogo cruzado, que era a carreira do magistério. Provoquei isso no início do ano quando criamos aquela comissão (de discussão da carreira dos professores), e quando veio essa situação, da doença, não sabíamos qual seria a semana em que seria votado o plano de carreira. Mandei mensagem no domingo para o líder do governo (deputado José Milton Scheffer) e para o deputado Julio Garcia, da Comissão de Finanças. Eu faria a cirurgia na segunda-feira. Disse para os dois, por favor, não votem a carreira antes de eu voltar.


A minha cabeça estava conflituosa entre esses dois momentos: tenho que me
cuidar e sou deputada, tenho responsabilidade. Consegui falar disso quando fui
sentindo milhares de mensagens de muito apoio, as pessoas vinham no meu ouvido
e diziam “Teu nome está nas minhas orações”. No momento que senti, falei. Nós
mulheres temos dificuldade, muitas vezes, de dizer o que a gente quer, para quem a
gente quer, no momento que a gente quer. A minha tentativa foi escolher quando
falo, para quem falo, e a forma que falo.

Como foi a descoberta do câncer? Foi um exame de rotina?


Em janeiro fiz uma mamografia e minha ginecologista disse que tinha algo que
precisava acompanhar, que eu deveria voltar em seis meses. Quando fiz a ressonância, ela me mandou uma mensagem, e eu estava na reunião da Comissão de Finanças. Era 13 de outubro. Quando vi a mensagem, perguntei se poderia ligar dali a alguns minutos. Saí da reunião e fui para trás, na sala dos deputados. Liguei para ela e disse – para você me perguntar quando estou em Chapecó é que o meu exame não deu bem. E ela disse sim, deu ruim. Sabe quando o mundo cai? Fui ao banheiro, chorei, não falei para ninguém. Dia 14 eu estava em Chapecó e dia 15 era Dia do Professor, foi quando marquei para fazer a biópsia. Na semana seguinte fiz a consulta (com o especialista), e dia 15 de novembro fiz a cirurgia. Você não vê a hora de fazer a cirurgia, tirar. Passar pelo pesadelo, se tratar e estar bem. O tempo de espera é agonizante.


O que é mais difícil, lidar coma questão física ou o peso emocional?


O peso emocional. A palavra câncer é de uma monstruosidade enorme, você associa câncer com terminalidade, com o fim da linha. Do ponto de vista emocional, é o maior desafio. Olhar para as pessoas, dizer eu vou sair dessa, mas será que vou mesmo? Tem aquela coisa, me curei, mas em outros voltou, em outras partes do corpo. Você vai tendo que lidar com o peso da palavra, do termo, do conceito.


E como foi o tratamento? A senhora fez pelo SUS, certo?

O processo inicial fiz pelo plano de saúde. A radioterapia foi no Hospital Regional (em Chapecó), que é o que todo mundo faz. A radioterapia não é tão agressiva quanto a quimio, em que você injeta medicamentos pesados no corpo inteiro. Mas o impacto que tive foi no dia em que senti que estava com uma doença grave.
Você entra no setor de radioterapia, coloca um jaleco azul e senta ao lado de todos
os pacientes, uns que tiveram queda de cabelo, outros que você percebe debilidade
do corpo, outros mais entusiasmados, mas de igual para igual.
Todo mundo ali para ser cuidado. São cinco minutos de radiação. Fiz num período de muito calor em Chapecó, de 17 de janeiro a 4 de fevereiro. A radiação queima, mas não tive nenhum efeito colateral. Em seis meses retorno ao médico e começo um tratamento com um comprimido por dia, durante cinco anos. Ele evita que essas células possam retornar.


Em um momento como esse, é preciso evitar o estresse. Mas ele faz parte
da atividade política. Como lidar?


O espaço da política, ainda mais do que vamos enfrentar este ano, é um espaço de muito conflito. Agora entrei numa outra fase, num exercício pessoal e coletivo de pensar melhor as agendas que a gente faz. Teve um período, antes de descobrir o câncer, que cheguei a fazer 12, 15 agendas num dia. Nenhum ser humano, no atual contexto que estamos vivendo, independente da profissão que siga, a não ser que faça muita terapia, seja muito zen, consegue viver sem conflito, sem estresse. Nesse contexto, precisamos eu, minha família, equipe, filtrar algumas coisas e me dar o tempo necessário.
Vou precisar dizer que tem tristeza, mas também tem alegria. Tem tragédia, mas também tem muita construção legal. As pessoas que passam pelo tratamento de câncer têm essas lições, de tentar a partir da dor fazer movimentos de ressignificação de espaços, lutas, coisas pessoais.

A experiência com a doença movimentou outras pautas para a bancada feminina. O que a senhora descobriu sobre as necessidades das mulheres que passam por esse tratamento?

A primeira coisa que os médicos falam é em ter a imunidade alta, se alimentar adequadamente. Alguns proteicos especiais, antes da cirurgia, uma meia para
evitar a trombose. Depois da cirurgia, um sutiã especial para ajudar na cicatrização
das mamas. Quando você faz as contas do quanto dá isso, e olhando para aquelas mulheres que eu encontrava na radioterapia, eu pensava – não posso me queixar, tenho
condições de fazer tudo isso. Mas pensei nas mulheres que dependem exclusivamente do que elas têm. Tem a Rede Feminina, mas elas mesmas dizem que não dão conta de tantos pedidos de cesta básica, de hidratante. Perguntei o que fazem quando uma mulher não pode comprar. Não compra, não tem.

Naquele momento, quando eu estava de licença, estávamos no período de votação do orçamento. Fiz uma chamada no grupo (de WhatsApp) das cinco, e propus colocarmos uma emenda parlamentar e começarmos a trabalhar um programa para mulheres pobres que sofrem de neoplasia mamaria. O relator da Comissão de Finanças, deputado Marcos Vieira, aceitou nossa proposta. E conversei com a (primeira-dama) Késia, pedi a ela para falar com o governador para ele não vetar. Não sei se ela fez isso, mas o governador não vetou. Então, temos R$ 10 milhões no orçamento deste ano para criar esse programa. O debate que a gente começou a fazer agora, ainda muito inicial, é na formatação desse programa. Penso que Assistência Social e Saúde terão que estar juntas nessa construção. Tem uma frase que eu digo, que da dor a gente fez luta, e da luta a gente fez conquista. Agora tem que chegar nas mulheres que precisam.

Como foi o retorno à Alesc?


Foi marcante, porque todas as pessoas que souberam, de uma forma ou outra, vieram falar comigo. Tive colegas da bancada feminina que foram fenomenais. Isso traz a lição, que tem coisas que podem nos unir. Fizemos uma reunião da bancada feminina aqui(no gabinete), as mulheres me perguntaram da cirurgia, eu disse: “Querem ver como ficou?”. Mostrei para elas o peito, outra colega, a (deputada) Marlene (Fengler), que também passou por câncer há mais tempo, também mostrou. Nessas horas, somos mulheres em luta pela vida. Aqui dentro senti muita empatia das mulheres e também muita torcida dos colegas, muita solidariedade, muito respeito. Mas, ao mesmo tempo, ninguém deu trégua para mim não (risos). Quando cheguei da cirurgia, já entramos no debate sobre
alguns projetos, e com marcação cerrada. Eu queria isso mesmo, foi o que construí.

Uma experiencia como essa é transformadora. A senhora é outra Luciane hoje?

Tem muitas coisas que … (pausa). Não gosto de dizer mais forte, porque o forte
está associado com não se emocionar, a um padrão. Não quero isso. Esse momento para mim disse o seguinte: faça o que quer fazer da tua vida, porque ela é tua, enfrente os medos e seja autêntica sempre. Traz essa dimensão de ter mais garra, como a saúde, que não era uma pauta que estava na minha dimensão de luta, e agora está. Chego à conclusão de que o que tem de mais revolucionário é a vida. Ela te joga para frente, te joga para trás, te vira do avesso, te permite estar aqui ou não estar. Acho que sou outra mulher, mas com tudo o que fui e com tudo o que descobri nessa tentativa de também dar força para as mulheres. Estou enxergando mais o feminino por trás de cada sofrimento, acho que é isso.

Fonte: Texto transcrito da publicação impressa da Revista NSC, edição de 19 a 25 de março de 2022

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Entrevista: NSC publica como Luciane Carminatti enfrentou o câncer que mais afeta as mulheres brasileiras

Entrevista assinada pela jornalista Dagmara Spautz, e originalmente publicada na edição impressa da Revista NSC, de 19 a 25 de março de 2022

Habituada aos embates que são parte do dia a dia na política, a deputada estadual Luciane Carminatti (PT) soube, aos 51 anos, que enfrentaria a maior batalha. E seria pela vida. A líder da bancada feminina da Assembleia Legislativa descobriu no ano passado um câncer de mama. A doença, que a afastou temporariamente das atividades legislativas no segundo semestre de 2021, foi tratada com discrição pela parlamentar.
Ela recebeu a reportagem no gabinete dela na Alesc em um dia simbólico: 8 de
Março, Dia Internacional da Mulher. Em cerca de meia hora de entrevista, a deputada revisitou os momentos mais difíceis da jornada contra o câncer.


Mais de uma vez, os olhos se encheram de lágrimas – mas a voz não falhou em nenhum momento. A única pausa ocorreu quando perguntei se a experiência havia feito da deputada uma nova mulher. Ela pensou durante alguns segundos antes de
responder que passou a enxergar o feminino por trás de cada sofrimento.
Nesta entrevista, Carminatti relata como a convivência com outras mulheres, sem condições financeiras de complementar o tratamento, fez despontarem novas frentes de luta na bancada feminina da Alesc. O câncer enfrentado pela deputada é o de maior prevalência entre as mulheres brasileiras, quase um terço do total.


São 60 mil novos casos ao ano, segundo dados do Instituto Nacional do Câncer
(Inca). Luciane Carminatti passou por cirurgia para retirada do tumor, radioterapia, e
agora segue em tratamento complementar preventivo. Confira detalhes na entrevista a seguir:

A senhora demorou um período para falar abertamente sobre o que aconteceu, por quê?

Sempre me cuidei, fiz os exames todo ano. Você leva um choque, porque pensa “Não pode ser comigo isso, faço mamografia todo ano. Como é que agora descubro que tenho dois nódulos na mama esquerda?”. Tem uma coisa que fui descobrindo,
e que as mulheres passam. Primeiro, é a negação da doença. Você não quer falar disso. Não me sentia inteira para dar conta do que as pessoas esperavam que eu falasse sobre isso naquele momento. É uma fase.

Fui lendo mais, ouvindo mais profissionais, e o meu médico foi muito hábil nisso, me mostrou que tem cura, tem tratamento. Quando fui sentindo o chão, fui começando a poder falar. E tinha ainda uma coisa, eu estava no meio de um debate na Assembleia, de um fogo cruzado, que era a carreira do magistério. Provoquei isso no início do ano quando criamos aquela comissão (de discussão da carreira dos professores), e quando veio essa situação, da doença, não sabíamos qual seria a semana em que seria votado o plano de carreira. Mandei mensagem no domingo para o líder do governo (deputado José Milton Scheffer) e para o deputado Julio Garcia, da Comissão de Finanças. Eu faria a cirurgia na segunda-feira. Disse para os dois, por favor, não votem a carreira antes de eu voltar.


A minha cabeça estava conflituosa entre esses dois momentos: tenho que me
cuidar e sou deputada, tenho responsabilidade. Consegui falar disso quando fui
sentindo milhares de mensagens de muito apoio, as pessoas vinham no meu ouvido
e diziam “Teu nome está nas minhas orações”. No momento que senti, falei. Nós
mulheres temos dificuldade, muitas vezes, de dizer o que a gente quer, para quem a
gente quer, no momento que a gente quer. A minha tentativa foi escolher quando
falo, para quem falo, e a forma que falo.

Como foi a descoberta do câncer? Foi um exame de rotina?


Em janeiro fiz uma mamografia e minha ginecologista disse que tinha algo que
precisava acompanhar, que eu deveria voltar em seis meses. Quando fiz a ressonância, ela me mandou uma mensagem, e eu estava na reunião da Comissão de Finanças. Era 13 de outubro. Quando vi a mensagem, perguntei se poderia ligar dali a alguns minutos. Saí da reunião e fui para trás, na sala dos deputados. Liguei para ela e disse – para você me perguntar quando estou em Chapecó é que o meu exame não deu bem. E ela disse sim, deu ruim. Sabe quando o mundo cai? Fui ao banheiro, chorei, não falei para ninguém. Dia 14 eu estava em Chapecó e dia 15 era Dia do Professor, foi quando marquei para fazer a biópsia. Na semana seguinte fiz a consulta (com o especialista), e dia 15 de novembro fiz a cirurgia. Você não vê a hora de fazer a cirurgia, tirar. Passar pelo pesadelo, se tratar e estar bem. O tempo de espera é agonizante.


O que é mais difícil, lidar coma questão física ou o peso emocional?


O peso emocional. A palavra câncer é de uma monstruosidade enorme, você associa câncer com terminalidade, com o fim da linha. Do ponto de vista emocional, é o maior desafio. Olhar para as pessoas, dizer eu vou sair dessa, mas será que vou mesmo? Tem aquela coisa, me curei, mas em outros voltou, em outras partes do corpo. Você vai tendo que lidar com o peso da palavra, do termo, do conceito.


E como foi o tratamento? A senhora fez pelo SUS, certo?

O processo inicial fiz pelo plano de saúde. A radioterapia foi no Hospital Regional (em Chapecó), que é o que todo mundo faz. A radioterapia não é tão agressiva quanto a quimio, em que você injeta medicamentos pesados no corpo inteiro. Mas o impacto que tive foi no dia em que senti que estava com uma doença grave.
Você entra no setor de radioterapia, coloca um jaleco azul e senta ao lado de todos
os pacientes, uns que tiveram queda de cabelo, outros que você percebe debilidade
do corpo, outros mais entusiasmados, mas de igual para igual.
Todo mundo ali para ser cuidado. São cinco minutos de radiação. Fiz num período de muito calor em Chapecó, de 17 de janeiro a 4 de fevereiro. A radiação queima, mas não tive nenhum efeito colateral. Em seis meses retorno ao médico e começo um tratamento com um comprimido por dia, durante cinco anos. Ele evita que essas células possam retornar.


Em um momento como esse, é preciso evitar o estresse. Mas ele faz parte
da atividade política. Como lidar?


O espaço da política, ainda mais do que vamos enfrentar este ano, é um espaço de muito conflito. Agora entrei numa outra fase, num exercício pessoal e coletivo de pensar melhor as agendas que a gente faz. Teve um período, antes de descobrir o câncer, que cheguei a fazer 12, 15 agendas num dia. Nenhum ser humano, no atual contexto que estamos vivendo, independente da profissão que siga, a não ser que faça muita terapia, seja muito zen, consegue viver sem conflito, sem estresse. Nesse contexto, precisamos eu, minha família, equipe, filtrar algumas coisas e me dar o tempo necessário.
Vou precisar dizer que tem tristeza, mas também tem alegria. Tem tragédia, mas também tem muita construção legal. As pessoas que passam pelo tratamento de câncer têm essas lições, de tentar a partir da dor fazer movimentos de ressignificação de espaços, lutas, coisas pessoais.

A experiência com a doença movimentou outras pautas para a bancada feminina. O que a senhora descobriu sobre as necessidades das mulheres que passam por esse tratamento?

A primeira coisa que os médicos falam é em ter a imunidade alta, se alimentar adequadamente. Alguns proteicos especiais, antes da cirurgia, uma meia para
evitar a trombose. Depois da cirurgia, um sutiã especial para ajudar na cicatrização
das mamas. Quando você faz as contas do quanto dá isso, e olhando para aquelas mulheres que eu encontrava na radioterapia, eu pensava – não posso me queixar, tenho
condições de fazer tudo isso. Mas pensei nas mulheres que dependem exclusivamente do que elas têm. Tem a Rede Feminina, mas elas mesmas dizem que não dão conta de tantos pedidos de cesta básica, de hidratante. Perguntei o que fazem quando uma mulher não pode comprar. Não compra, não tem.

Naquele momento, quando eu estava de licença, estávamos no período de votação do orçamento. Fiz uma chamada no grupo (de WhatsApp) das cinco, e propus colocarmos uma emenda parlamentar e começarmos a trabalhar um programa para mulheres pobres que sofrem de neoplasia mamaria. O relator da Comissão de Finanças, deputado Marcos Vieira, aceitou nossa proposta. E conversei com a (primeira-dama) Késia, pedi a ela para falar com o governador para ele não vetar. Não sei se ela fez isso, mas o governador não vetou. Então, temos R$ 10 milhões no orçamento deste ano para criar esse programa. O debate que a gente começou a fazer agora, ainda muito inicial, é na formatação desse programa. Penso que Assistência Social e Saúde terão que estar juntas nessa construção. Tem uma frase que eu digo, que da dor a gente fez luta, e da luta a gente fez conquista. Agora tem que chegar nas mulheres que precisam.

Como foi o retorno à Alesc?


Foi marcante, porque todas as pessoas que souberam, de uma forma ou outra, vieram falar comigo. Tive colegas da bancada feminina que foram fenomenais. Isso traz a lição, que tem coisas que podem nos unir. Fizemos uma reunião da bancada feminina aqui(no gabinete), as mulheres me perguntaram da cirurgia, eu disse: “Querem ver como ficou?”. Mostrei para elas o peito, outra colega, a (deputada) Marlene (Fengler), que também passou por câncer há mais tempo, também mostrou. Nessas horas, somos mulheres em luta pela vida. Aqui dentro senti muita empatia das mulheres e também muita torcida dos colegas, muita solidariedade, muito respeito. Mas, ao mesmo tempo, ninguém deu trégua para mim não (risos). Quando cheguei da cirurgia, já entramos no debate sobre
alguns projetos, e com marcação cerrada. Eu queria isso mesmo, foi o que construí.

Uma experiencia como essa é transformadora. A senhora é outra Luciane hoje?

Tem muitas coisas que … (pausa). Não gosto de dizer mais forte, porque o forte
está associado com não se emocionar, a um padrão. Não quero isso. Esse momento para mim disse o seguinte: faça o que quer fazer da tua vida, porque ela é tua, enfrente os medos e seja autêntica sempre. Traz essa dimensão de ter mais garra, como a saúde, que não era uma pauta que estava na minha dimensão de luta, e agora está. Chego à conclusão de que o que tem de mais revolucionário é a vida. Ela te joga para frente, te joga para trás, te vira do avesso, te permite estar aqui ou não estar. Acho que sou outra mulher, mas com tudo o que fui e com tudo o que descobri nessa tentativa de também dar força para as mulheres. Estou enxergando mais o feminino por trás de cada sofrimento, acho que é isso.

Fonte: Texto transcrito da publicação impressa da Revista NSC, edição de 19 a 25 de março de 2022

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